Jerry Lee Lewis – O gênio indomável


Jerry-Lee-Lewis-4.JPGGrande precursor do uso das teclas no rock’n’roll, Jerry Lee Lewis teve vida e carreira extremamente conturbadas para a época, mas é reconhecido como um dos mais importantes expoentes de sua geração e de seu estilo

“The Killer”, o apelido recebido por Jerry Lee Lewis em seus tempos áureos, representa muito bem a voz poderosa, o modo de tocar piano e a forma para lá de irreverente e enérgica de se apresentar nos palcos e viver a vida de um dos mais destacados nomes
do rock’n’roll. Contestador, polêmico, por vezes irresponsável e imprevisível, Lewis encarnou como poucos o estereótipo do gênero, reforçando a imagem da “juventude transviada”. Nascido em Ferriday, Louisiana, em 29 de
setembro de 1935, Jerry Lee Lewis é o típico músico sulista de sua época. De família pobre, o primeiro piano foi comprado por seus pais graças à hipoteca da própria casa, quando o músico tinha dez anos e, aos 14, apresentou- se pela primeira vez profissionalmente. Foi autodidata nos estudos, pois teve apenas uma aula de piano em que seu professor não gostou do jeito dele. Recebeu umas dicas de seu primo, o pianista de boogie-woogie Carl McVoy, e seguiu desenvolvendo sua técnica na música gospel, em igrejas pentecostais sulistas, assim como outros importantes artistas de sua época como Roy Orbison, Carl Perkins, Johnny Cash e Elvis Presley. Entre suas influências, o músico cita artistas de rádio de sua adolescência, como Jimmie Rodgers, Hank Williams e Al Jolson. Apesar de sua formação, foi expulso do Southwestern Bible Institute, em Waxahachie, Texas, por má conduta o que incluía, segundo dizem, tocar “My God Is Real” [Meu Deus É Real] em ritmo de boogie-woogie. Praticamente abandonou os estudos depois desse episódio, dedicando-se à música.

Ascenção
Lewis acabou indo para Memphis, Tennessee, onde encontrou trabalho como músico no famoso Sun Studios de onde saíram vários artistas que marcaram época. Em 1956, gravou seu primeiro single, “Crazy Arms”, um cover de Ray Price, que rapidamente teve sucesso local. Também trabalhou em algumas sessões de gravação com Carl Perkins. Enquanto trabalhava na Sun, ele e Perkins tocaram com Elvis Presley e Johnny Cash em um encontro que mais tarde recebeu o nome de “Million Dollar Quartet”. Sam Philips, famoso produtor da época deixou o gravador ligado durante a seção, mas o material demorou muitos anos para ser liberado. Em 1957, gravou o single “Whole Lotta Shakin’ Goin’ On” que o lançou à fama internacional. Logo em seguida, foi a vez de “Great Balls Of Fire”, seu maior sucesso. Nessa mesma época, desenvolveu seu estilo irreverente nos palcos, em apresentações cheias de energia em que chutava o banco para poder tocar de pé, usava muitos glissandos, subia no instrumento, pisava e sentava nas teclas, e batia nelas como se fossem um instrumento de percussão. Por vezes, chegava a colocar fogo no piano (bem antes de Jimmy Hendrix fazer o mesmo com a guitarra). Lewis conta que muitas vezes dividiu palcos com Chuck Berry, disputando para ver quem era o mais louco, até que lançava mão desse artifício, impossível de Berry revidar. Essa pura competição para ver quem chamava mais atenção do público acabou lhe rendendo a fama de incendiário do piano.

Decadência
Costuma-se associar seu declínio com a rejeição do público ao seu casamento com a prima de segundo grau Myra Gail Brown, de 13 anos, na época em que ele tinha 23. Mantido em segredo por algum tempo, o casamento se tornou público em 1958, provocando um escândalo, em meio a uma turnê britânica cancelada depois de apenas três shows. A desaprovação seguiu Lewis até a América e ele quase foi banido do cenário musical. As rádios se negavam a tocar suas músicas e ninguém o contratava para shows. Além disso, tinha fama de valentão e bebia muito, embora todos os esforços fossem feitos para esconder isso do público. De fato, tudo isso contribuiu muito para sua queda, mas a realidade é que essa época marcou o fim da carreira meteórica dos artistas da primeira fase do rock’n’roll e o surgimento de novos nomes. Depois disso, seu próximo sucesso foi uma versão de “What’d I Say”, de Ray Charles, lançada em 1961. Aos poucos, sua popularidade foi se reerguendo na Europa e América. Em 1964, gravou o álbum ao vivo, ‘’Live At The Star Club, Hamburg”, com a banda The Nashville Teens, bem recebido pela crítica e público, considerado um dos melhores discos ao vivo da história do rock. Durante o restante da década de 60, Lewis manteve a carreira dando mais ênfase ao lado country de seu estilo e lançou mais alguns hits, como “Chantilly Lace”, porém nunca mais conseguiu alcançar o sucesso que teve antes de 1958.
Jerry-Lee-Lewis-1.JPGVida conturbada
Jerry Lee Lewis nunca foi exemplo de comportamento. Na verdade, é um sobrevivente. Enfrentou problemas com álcool e drogas desde a juventude, passou por seis casamentos (está no sétimo) e perdeu dois filhos precocemente. Sua quarta esposa morreu afogada em uma piscina, sob circunstâncias suspeitas. Pouco mais de um ano depois, sua quinta esposa seria encontrada morta de overdose. Foi preso algumas vezes por incidentes com brigas, álcool e até com armas. Em 1985 chegou a ficar em coma e teve de ter seu estômago extirpado em virtude de uma úlcera que nunca se curou. Em 1996, sofreu o seu terceiro ataque cardíaco mas continuou tocando como antes. Em suas próprias palavras: “Há apenas um Jerry Lee Lewis e isto aqui vai ser um mundo muito triste quando eu tiver morrido”.

Reconhecimento
Em 1986, Jerry Lee Lewis foi incluído na primeira leva de artistas a serem homenageados no Hall da Fama do Rock and Roll. No palco, continuava apresentando a mesma performance explosiva, apesar dos problemas pessoais e da idade. Três anos mais tarde, um longa metragem sobre o começo da carreira de Lewis, intitulado Great Balls of Fire!, foi produzido, baseado no livro escrito por sua prima e ex-esposa Myra. Em fevereiro de 2005, ganhou um prêmio pelo conjunto da obra da Record Academy, organizadora do Grammy, e, um ano depois, lançou o CD “Last Man Standing”, em que registrou uma série de clássicos do rock e do blues com a ajuda de admiradores famosos como Mick Jagger, Keith Richards, Kris Kristofferson, Willie Nelson e Buddy Guy. O álbum teve um grande sucesso de público e de crítica e muitos o consideram o melhor álbum da carreira de Lewis. Em abril de 2013, Lewis inaugurou o Jerry Lee Lewis Café & Honky Tonk, na histórica Beale Street, em Memphis, Tennessee, decorado com o piano do “The Killer”, motocicletas, fotos e recordações. Lewis nunca deixou de fazer turnês, e os fãs que o veem se apresentar dizem que ele ainda consegue fazer um show único, sempre imprevisível, empolgante e pessoal. Infelizmente, no entanto nem todas as apresentações terminam bem: os sucessivos atrasos e o abandono do palco após alguns minutos são queixas recorrentes do público pagante ao redor do mundo. Desbravador, ousado e inovador, Jerry Lee Lewis misturou rhythm and blues, boogie- woogie, gospel e country com maestria, e, apesar de seus problemas pessoais, nunca teve seu talento musical questionado, sendo descrito por Roy Orbison como “o melhor artista cru da história do rock”.

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