Fabio Ribeiro: referência brasileira em teclados no heavy metal


fabio-ribeiro-por-duca-mendesDestacando-se em meio à mesmice que assolou o mercado fonográfico no que diz respeito às teclas, Fabio Ribeiro continua afirmando: ser diferente é importante

Referência em teclados no heavy metal, sintetizadores e novas tecnologias, Fabio Ribeiro tem sólida carreira como instrumentista, ultrapassando os limites do convencional, mesmo para o estilo que o consagrou. No início dos anos 80, motivado a tocar com outros músicos, ingressou em sua primeira banda, Annubis, na guitarra. Em 1985, assumiu os teclados, além do piano, e começou a se aprofundar em música eletrônica e programação de sintetizadores. A partir daí, iniciou uma sucessão de trabalhos que inclui a formação da banda Desequilíbrios e participações em álbuns e shows dos grupos Clavion, III Milenio, Antitese, Revenge, A Chave do Sol, Overdose, Anjos da Noite e Violeta de Outono. O primeiro projeto-solo, o álbum Blezqi Zatsaz – Rise and Fall Of Passional Sanity, surgiu em 1991. Dois anos depois, estava na primeira formação da banda Angra e participou do primeiro concerto da história do grupo. Em 2001, passou a trabalhar com o Shaaman e, no ano seguinte, veio o segundo trabalho-solo: Blezqi Zatsaz – The Tide Turns foi lançado no Brasil, nos Estados Unidos e na Europa.

O sonho de ter um estúdio de produção e gravação realizou-se em 2002, com a inauguração do The Brainless Brothers, em que foram desenvolvidos diversos projetos, entre eles Henceforth, Shaaman, Violeta de Outono, Fuga, Headgear, Andre Matos e Remove Silence, banda que mantém em atividade.

Paralelamente, Ribeiro ingressou no trabalho de consultoria para empresas fabricantes de instrumentos musicais eletrônicos, prestando serviços como especialista de produtos e programador para diversas delas. Tudo isso o credencia como um dos mais experientes integrantes desse maravilhoso universo das teclas.

Você é uma referência quando se fala em tecladista de rock no Brasil. Com vê isso?
O tecladista no Brasil é algo meio raro. Acho isso maluco. Outros instrumentos tem uma quantidade bem maior de músicos que o teclado. Eu não entendo muito bem a razão, porque considero o teclado um dos instrumentos mais divertidos – se não o mais divertido de todos -, o que mais te ajuda a criar sozinho, a ser autossuficiente em termos de composição, arranjo e tudo mais. Acredito que todo músico, independentemente do instrumento que toque, deveria se aprofundar mais, não no teclado em si, porque nem é esse mais o termo, mas na estação de trabalho. E também não há mais aquela dependência de “saber tocar as teclas” para criar alguma coisa, se é que essas teclas estão presentes. Vemos coisas como o iPad, hoje em dia, em que você cria com facilidade enorme, sem saber música, sem saber nada. Então, todo instrumentista deveria investir nessa parte de tecnologia, com um afinco tão grande quanto aquele com que ele estuda música ou seu próprio instrumento. É extremamente útil para o desenvolvimento musical de todas as formas. Acabei indo para essa parte de tecnologia logo quando comecei com os teclados, por necessidade mesmo. Não havia informação a respeito de instrumentos musicais eletrônicos na época. Existia a revista Som3, que às vezes publicava algumas matérias interessantes, mas era praticamente só. Daí surgiu a necessidade de comprar livros de síntese e começar a ler a respeito. Logicamente, fui autodidata. Nunca tive aulas disso, nem uma vez na vida. Foi tudo por pesquisas próprias, algo de gosto, de amor pela coisa. Foi um interesse meu. Acabei crescendo nesse sentido.

fabio-ribeiro10-199x300Você acha que, atualmente, com todas as facilidades disponíveis, existe interesse das pessoas em se aprofundarem?
Quanto mais informações temos, menos vamos atrás. Antigamente parecia que as pessoas eram mais ligadas, mais interessadas em aprender as coisas. Hoje, com essa quantidade enorme de informação, a pessoa nem tem tempo de assimilar direito um assunto antes de partir para o próximo. A menos que ela esteja focada. Então, o que falta na verdade é um pouco de foco, de objetivo, perante essa quantidade de informações. Tudo é muito fácil. Quando comecei, nem presets de teclado existiam, estavam surgindo naquele momento. Aquela coisa de você escolher um som e sair tocando, não existia. Normalmente, você tinha que começar do zero e construir a sonoridade. Isso era legal, também, a meu ver, por que imprimia um caráter do tecladista, além do musical, além do lance de ele tocar de tal jeito, de ser conhecido pelos dotes musicias, pelas técnicas particulares de instrumentista. Muita gente é reconhecida por isso. Você houve alguém e diz: é o cara tal que está tocando. Mas, na época, o tecladista tinha mais esse elemento, algo que se perdeu muito de lá para cá: a personalidade do som, do timbre. Você houve Rick Wakeman ou Keith Emerson, por exemplo, ou o próprio Jon Lord, e você os reconhece não somente pelo modo com que estão tocando, mas pelo som que está saindo do instrumento. Ou seja, o cara programava os próprios timbres e fazia um som personalizado. E isso fazia parte da característica musical dele. Isso se perdeu.

Qual o papel do tecladista numa banda de rock? Depois do progressivo, principalmente, o que aconteceu?
O progressivo foi o ponto em que a gente fez realmente a grande diferença. É engraçado. Eu não procuro saber a razão, mas é estranho você ver como um instrumento é menosprezado em determinado estilo. Hoje, mais ainda. Você não vê tecladista em banda de rock. Simplesmente ele não existe. Piadinhas na internet, se vê com todo mundo, menos com tecladistas (risos). Lá tem os integrantes de uma banda, e quatro caras: vocal, guitarra, baixo e batera. E acabou! Não tem tecladista! (risos) Acho isso muito louco, porque é o instrumento que te proporciona a maior coleção de sons do que qualquer outro. O músico consegue interpretar por meio dele qualquer ideia que tenha, mas ele é mal aproveitado. O rock é um estilo de guitarra, foi criado assim. Mas acho estranho que nos anos 70 os teclados eram muito mais bem aproveitados e respeitados. Talvez também seja pelo fato de que, naquela época, havia tecladistas de mais atitude. Talvez isso tenha feito a diferença. Keiht Emerson, por exemplo, foi o Jimi Hendrix nos teclados. Jon Lord foi outro. Chegou ali e falou “nós vamos chutar o balde, não é só o guitarrista que faz baderna no palco, que coloca o som pra fora”. Falta um pouco disso hoje em dia também. Falta atitude do tecladista. É muito raro. Mesmo os que tocam muito bem, não tem aquela garra, aquela presença, aquela força. O cara tem que ser meio mala, não pode ser tão comportado. Rock é um estilo assim.

7As produções mais bem conceituadas estão se voltando para os instrumentos vintage?
Sim, porque eles geram sons exclusivos. E são completamente manipuláveis. É diferente ter um sample que se pode manipular, processando, até certo ponto. Mas o material bruto não se consegue modificar. Há essa limitação que é próprio sample. E um oscilador analógico – ou um simulador digital de um oscilador analógico – não tem essas limitações. Você vai conseguir alterar aquilo da maneira que quiser, criando uma forma de onda completamente nova, ou seja, criando um som novo.

Você tem usado iPads para produzir?
Me apaixonei pela “iOS music”. Faz dois anos, mais ou menos, que entrei nesse universo. Um pouco atrasado, mas nem tanto, porque na época também não existiam tantos aplicativos profissionais. As coisas estavam meio que esquentando ainda. Tanto que muita gente hoje, 2 ou 3 anos depois do lançamento, ainda acha que é brinquedo. Existe certo preconceito. É, na verdade, um universo à parte, não só pelo fato de ser móvel, e ser possível fazer música no ônibus ou na praia ou em qualquer lugar que seja. Mas pelos aplicativos serem muito intuitos, porque são criados para um público “genérico”, em primeiro lugar. Talvez por isso o fato de as pessoas pensarem que era tudo brinquedinho. E era mesmo. Não havia aplicativos com qualidade. A Korg foi um dos primeiros fabricantes a implementar o MS-20 e umas coisas mais legais. Mas isso me pegou de maneira absurda, porque a facilidade e a qualidade são maravilhosas. O que me chamou mais a atenção no dispositivo em si foram, em primeiro lugar, a facilidade, porque não é necessário realmente ser músico para criar alguma coisa de qualidade ali. Desenvolvem coisas para facilitar a composição. Outra coisa é a própria tela multitouch. Existem certas técnicas que você usa para tocar na tela que, simplesmente, não tem a menor possibilidade executar no teclado. Ou seja, novamente vem aquele quesito: você vai criar algo completamente novo com aquilo. Certas técnicas de sliding polifônico entre as notas, são coisas que não há como executar em outro instrumento, nem nos não temperados, de corda! É um universo a parte e cresceu absurdamente de um ano e pouco para cá.

 

 

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